Um olhar sobre a depressão na contemporaneidade. E eu com isso?

A depressão é considerada uma patologia mental. Não se trata de um fenômeno recente, tem histórico de sintomas da doença em culturas e sociedades bem antigas. No entanto, o olhar que se propõe aqui é de analisar a interlocução desta patologia com a sociedade atual. Como que o modo de vida, os conceitos e ideais modernos atingem a saúde mental do homem? Aqui se propõe um olhar crítico em relação a psicopatologia. Não será focado o diagnóstico em si nem o entendimento biológico ou psiquiátrico sobre a depressão. Não se tem a pretensão de esgotar o tema e sim pincelar ideias para novas conversas, de forma a ir aprofundando em outros textos.
A sociedade contemporânea é influenciada por discursos individualistas, ou seja, cada um com seus problemas, cada um no seu quadrado (que podemos entender como a casa, por exemplo), cada um com seu esforço próprio para atingir o sucesso. A tal da meritocracia.
Por um lado temos a sociedade capitalista e globalizada que o tempo todo nos transmite a mensagem do Ter em detrimento do Ser. O sucesso e a realização pessoal são reconhecidos no status social, profissional, nas marcas que se usa, nas viagens que se faz, no local onde se mora, nos bens que possui, e assim por diante. Por outro lado, temos a mensagem passada o tempo todo que é preciso ser feliz, é preciso se amar, é preciso desapegar. Você é autossuficiente, e nisso tudo, algo chama a atenção para o tanto que estamos imersos em uma cultura egocêntrica e individualista. E o quanto isso pode contribuir para o crescente número de patologias na modernidade, bem como o crescente número de pessoas que apresentam-se com problemas relacionados a depressão.
Segundo os dados da OMS, o Brasil é o país com maior prevalência de depressão da América Latina e o segundo com maior prevalência nas Américas, ficando atrás somente dos Estados Unidos. Moreira, em estudos já realizados, dentro da intenção de fazer uma leitura de uma psicopatologia critica, chama a atenção para, a indiferença frente ao outro, em uma sociedade de desigualdade e exclusão social, é um fator marcante na etiologia da depressão. Ou seja, vivemos no mundo onde os interesses individuais sobrepõem a coletividade. Se eu consegui “vencer na vida” e comprar minha casa, meu carro, minha bolsa de marca, qualquer outro pode vencer. E neste caso, fecho os olhos para aqueles que, por ventura vivem na miséria.
Partindo desses aspectos, podemos buscar uma compreensão do adoecimento para além das questões individuais ou biológicas. Não se trata apenas de aumentar o nível de serotonina no organismo, mas de provocar uma reflexão sobre o mundo que nos cerca. Portanto, não é algo para se tratar apenas na clínica com o paciente depressivo, mas sim de nos provocar diante do que somos submetidos.
“O desvirtuamento dos afetos na contemporaneidade faz parte da gênese da epidemia de depressão em que vivemos. O amor por si mesmo substitui o amor à comunidade, amor a um ideal ou mesmo o amor religioso (ou não) pelo próximo.” (Moreira, 2009).
Considerada como desordem afetiva, a depressão diz de sentimentos de desesperança, tristeza, falta de vontade, falta de energia e motivação. Neste sentido, Moreira, nos conduz a esse olhar mais crítico e ampliado, levando a reflexões de o quanto a sociedade contemporânea influencia os afetos.
Estamos diante da dificuldade hoje de se fazer laços sociais e de se afetar. O coletivo, a comunidade, o outro, o estar com o outro, o cuidar, são entendimentos pulverizados e pouco fortalecidos no mundo contemporâneo. O sentimento de humanidade é perdido em meio a busca frenética pra sobreviver e se destacar em uma sociedade competitiva e consumista.
Neste sentindo, a depressão é sim uma doença alimentada pelo modelo social no qual estamos inseridos. É necessário rupturas com tais influencias, sensibilizações e ajudas que nos conduzam a busca de sentido da vida. Propiciar o fortalecimento e empoderamento da pessoa e do seu grupo.
“A sociedade contemporânea esta doente dos afetos, (...), portanto, adoece, despotencializa e incapacita os indivíduos a viver significamente, e impõe a ordem do desafeto, que se transforma em depressão e em outras patologias mentais.” (Moreira, 2009)
É através do amor, da acolhida, da atenção, da valorização do outro que podemos prevenir e tratar o problema da depressão. É preciso cuidar do Ser, mas antes de tudo é preciso cuidar do mundo (ser-no-mundo).
Referência Bibliográfica:
http://g1.globo.com/bemestar/noticia/depressao-cresce-no-mundo-segundo-oms-brasil-tem-maior-prevalencia-da-america-latina.ghtml
MOREIRA, Virginia. Clinica Humanista-fenomenológica – estudos em psicoterapia e psicopatologia crítica. São Paulo: Annablume, 2009.